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sábado, 28 de agosto de 2010

SÃO PAULO, CORINTHIANS, MY BROTHER, COHABs E A COPA

Autor: Carlos Augusto Machado

Para se desencadear o processo da escrita requer causas bem simples: momentos de excitação, insônia, além de muitos assuntos que se misturam. Poderia devanear-se sobre a beleza e sofreguidão dos escritos de Garcia Marquez, ou José Saramago, porém atemo-nos a uma foto em preto e branco da infância no bairro Pq. Edu Chaves. Lá estavam este escriba, o irmão, o pai e uma garrafa de coca, à mesa, festejando a chegada do Sul e o natal de 1981.

Ambos vestiam camisa de um time de futebol que dentro de alguns anos, seria hegemônico, ou seja, menciono obviamente o São Paulo. Soube-se que seguramente aqueles guris foram influenciadas pelo genitor. Lamento informar, o mais jovem, cerca de cinco anos, estava a poucos passos de abandonar as fileiras tricolores. Conta-se que o mercenário aceitou dez reais oferecidos por uma tia também alvinegra, ato perdoável tratando-se de uma criança que dezenove anos depois ficaria também no coração e memória das filhas e da família. Quanto a tia será descontado pois levou-me ao show anual do rei Roberto Carlos no Ginásio do Ibirapuera e presenteou-me com o primeiro LP Grease - nos Tempos da Brilhantina.

Outra recordação que assoma à vista cansada é a chegada no bairro de Itaquera, Conjunto José Bonifácio. Situado em extremo oposto na cidade a outro conjunto habitacional, o de Carapicuiba, este objeto de incansável alusão de candidato a cobiçada função de Senador.

Foram considerados por muito tempo pejorativamente de bairros dormitórios, as COHABs. Antes, sem deixar de fazer um tour por Artur Alvim, onde temos a Cohab I, a pioneira. Depois, apenas para o ilustre leitor não confundir as bolas temos a Cohab II, e assim a seguem-se as demais, Juscelino, Prestes Maia, Inácio Monteiro, sem deixar de fora Cidade Tiradentes, Castro Alves, Barro Branco, Santa Etelvina, perdoem-me o lapso, por assim dizer estamos em linha reta, apenas com algumas curvas. Parafraseando Fernando Pessoa temos um grande poema em linha reta visual.

Parte desta região hoje é atravessada por uma grande avenida a Jacu Pêssego interligando São Mateus, passa por Itaquera, V.Jacui, São Miguel e vai até Guarulhos. Outrora, existia apenas neste lugar um caminho onde devido ao mato, não se via a brasília ou o fusca que vinham em sentido contrário, em suma, só passava um carro por vez. Hoje, bem em frente a este ponto, estuda-se a construção de uma universidade federal.

Entretanto, sabemos que tais prédios e algumas casas são característicos de uma política populista visando uma solução imediatista para a expansão populacional e a conseqüente demanda habitacional. Ademais, sem planejamento, urbanismo, transportes e demais serviços públicos como educação, segurança, cultura, lazer e sobretudo neste pacote a qualidade dos serviços e da própria vida, estarão fadados a trazer mais problemas que soluções.

Enfim, em poucos anos a juventude tornou-se breve, sem muitas opções grassaram os bailinhos, as discoteques improvisadas em edifícios, geralmente nos andares térreos. Se parasse por ai seríamos felizes e fomos apesar das brigas que circunscreviam-se a princípio na delimitação das ruas, uma rua contra a outra. Com o advento, ou o incremento nefasto da arma de fogo como instrumento “mediador” das constrovérsias revelava que o crime infiltrara-se. Proporcionalmente, e é oportuna a estatística, a cada dez colegas seis foram assassinados, dois estão presos, um está internado e o último felizmente vivo e/ou com um emprego.

Sei, caro leitor que isto não é privilégio de nossa capital e sim dos grandes centros. A variação é que aqui escolheu-se o concreto vertical enquanto na Cidade de Deus, por exemplo, o horizontal.

Foi nesta região, mais especificamente em Guaianazes, em inauguração de obra que vi com o meu sogro mineiro, morador da Bahia, pela primeira vez o mito, nosso Presidente Lula, ao vivo e em cores, durante o primeiro mandato. Deveras, estávamos a alguns quilômetros do palanque. E que espero ver, outro mito, quer queiram ou não é um fenômeno: o jogador Ronaldo. Os campeões espanhóis não se acanharam ao homenajear Ronaldinho Gaúcho ídolo do Barçelona.

Bem como, vejo minhas filhas crescerem, minha mãe sem terapia superar o trauma de ver a vida de um filho ceifada violentamente. E hoje busco manter-me neste bairro que aprendemos a abraçar antes de partirmos ou nos lamentar-mos por não tê-lo feito.

É penoso, dilacerante, passar uma noite vendo o corpo de um familiar seu estirado no asfalto, defronte de mais um prédio, esperando o carro do IML, os curiosos que nada auxiliam, e repito, o pranto e a dor sobretudo dos pais que vêem seu filho precocemente e inexoravelmente perdido para sempre, mais uma vítima dessa violência urbana. Muito comum em centenas de famílias Brasil afora. Por que não pensarmos em tudo isso antes. A infraestrutura vem depois. Primeiro o paliativo, depois quem sabe, o conforto e a traquilidade. Nossos políticos seriam “paternalistas” demais se agissem diversamente.

Portanto, dessa forma ele não pode ver a construção anunciada do estádio de seu grande e controverso time, e como membro da torcida gaviã, se me permitem os tricolores sauda´-lo. Numa fantasiosa, porém ecumênica celebração de quem foi uma grande figura. Perderem-se as ilusões mas as esperanças elas permanecem e revigoram-se. Cantaram: “mudaram-se as estações, nada mudou... é certo que alguma coisa está para acontecer ...”

Um comentário:

  1. Carlos,

    Parabéns por suas palavras que retratam nossa zona leste com sua metamorfose.

    É ótimo poder acordar domingo pela manhã e ter a oportunidade de uma leitura tão fascinante.

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